sábado, 3 de janeiro de 2009

A história de uma paixão.

Eu o conheci por aí. Ele era perdido num mundo de fantasias e abstrações, e num mundo lírico de fantasias e abstrações, eu me perderia. Mas no universo dele nunca haveria espaço para nada nem ninguém. Ele parecia se preencher com toda aquela emoção, aquele homem transpirava arte. Quando o vi, soube que queria tê-lo comigo. Acho que foi tudo devido ao fato de ter o olhado tanto e ele nem notar minha presença. Aquela indiferença foi fatal, esse meu gosto pelo inatingível é cruel.
O desdém dos cabelos, dos olhos, do sorriso, espalhando perfume, charme e beleza para o mundo todo, menos pra mim, foi fatal. Entre ele e eu havia uma multidão, ele era o centro de toda a atenção. Naquele momento, tive a oportunidade de oferecer a mão para cumprimenta-lo e de brinde eu poderia oferecer um sorriso fingido que receberia resposta por simples educação, porém me recusei. Não sei porque, mas tive medo. Acho que senti que oferecer o aperto de mãos era muito pouco, queria oferecer minha vida inteira e aquele não era mesmo o melhor momento. Me reduzi aos sonhos que criei imaginando ele ao meu lado naquele intervalo de no máximo 1 minuto.
Continuei seguindo a multidão, caminhei pela calçada como se minha vida fosse continuar a mesma. Pobre de mim. Tentei prestar atenção na minha companhia. Como é freqüente acontecer, eu estava ali acompanhada, mas não estava aqui nesse mundo. E não pude conter meu comentário: Nossa, aquele cara lá era talentoso, né? Recebi uma resposta afirmativa e fui deixada em casa.
Caminhei até a portaria, tirando a chave da bolsa e observando se o carro já havia partido ou se o motorista continuava ali se certificando que eu chegaria bem em casa, ou algum outro motivo. Hábito esse que tinha e ainda tenho, mas naquela época a chave carregava um chaveiro enorme e infantil.
Já no elevador, me reparo no espelho, critico minha roupa e o que a preenche. Chego em casa e vou diretamente para o quarto. Ponho um pijama e acho que vou sonhar feliz com um jogador de futebol. Mas daquela noite em diante o jogador não tinha mais vez. Um sonho novo veio, o tal inatingível era o novo personagem principal. Pela manhã decidi procurar por ele e sem muito esforço o encontrei.
Ele entrou na minha vida arrasando meu equilíbrio. Os dias pareciam intermináveis na espera de conversarmos. As noites eram longas demais sem seus telefonemas pra falar das estrelas, da poesia, da filosofia e da sua solidão. Ele fez algum truque, fez com que eu pudesse associar tudo que me rodeava a ele. Pra mim era forte demais, mas ele era só o rei das madrugadas solitárias regadas a álcool, pra ele era só mais um telefonema, porque dormir era mais difícil. Ele abalava minha estrutura depois ia embora silencioso e sossegado. Dia após dia meus pensamentos estavam nele. Noite após noite meus beijos eram só dele.
Nunca sei que horas eram, não faço a mínima idéia do mês ou do dia, mas lembro desses acontecidos sempre que existe um espaço vago no meu pensamento. E hoje é estranho lembrar quantos intervalos livres de pensamentos eu criei e crio novamente escrevendo isso. Unicamente por não conseguir entender como, nem porque aquilo deu certo. Se é que alguma parte da minha vida amorosa pode ser julgada como certa. Como aqueles quase 60 segundos, fixando intensamente o olhar nele e os olhos dele muito importantes para se encontrarem com os meus, mudaram meu caminho.
Estava eu, depois de algumas semanas, totalmente perdida nele mesmo sabendo que na vida dele nunca haveria espaço pra mim, mas que quando estava monótona demais apelava para minha companhia. Eu sabia que aquelas emoções nunca seriam verdadeiramente minhas, porém eu estava sempre ali por perto beirando o universo dele, querendo ocupar um espaço mesmo que pequeno, mesmo que desprivilegiado nos pensamentos que ele carregava. Me sentia completa quando aqueles cabelos perfumavam minha pele, quando aqueles olhos jogavam charme se fixando nos meus, quando aquele sorriso bonito surgia largo e sincero para mim. Vivia disso, por isso, para isso. Para me sentir nele, para me sentir viva.
Me fazia muito bem até o dia que me vi viciada na emoção. Ele me oferecia paixão em doses homeopáticas, eu só pedia mais. Ele não podia me amar quando eu sentia vontade, a indiferença agora me maltratava, o gosto pelo inatingível era cada vez mais amargo. Ele queria perfumar os seus cabelos na minha pele, quando sobrava tempo pela madrugada, queria mirar olhares no meu corpo, quando estava infeliz com a vida, queria desmanchar o sorriso largo no meu pescoço, quando estava cansado de se sentir só. Ele era livre, eu era só mais uma viciada... Nos beijos, nas palavras, naquele falso amor.
Eu continuei minha vida, construí meu mundo de poesia e solidão, nele também não há espaço para ninguém. O meu universo preenchi com livros, canções e com tudo o mais que ele me mostrou ser interessante.
Eu absorvia tudo o que ele falava, como se ele tivesse sido uma espécie de professor. Segui minha vida espalhando emoções fracas em doses homeopáticas, maltratando com indiferença quem não me machucou. Querendo sentir de novo aquele arrepio na nuca. Procurando alguém que me fizesse um nó na garganta. Que me desse um pouco de paixão, mas bem dada. Enquanto tentava achar alguém, que me fizesse sentir o que ele fazia, a quantidade de cortes que fiz em corações vulneráveis só aumentava. Sei que depois de adquirir aquela dependência por emoções intensas, mas sem verdade, ainda após anos não sei como é ser amada de verdade. A indiferença dele que ainda vive é fatal, esse meu gosto pelo inatingível sempre vai ser cruel.